Eu assisti o maestro em campo. Ao vivo. Muitos viram. Muitos "Verón". Não lembro se na época ele já carregava o 11 às costas. Acredito que sim. Mas tempos depois, quando o vi novamente - desta vez pela televisão, ele trajava a camisa 11. Tenho certeza disso. Ela tinha listras verticais. Umas vermelhas. Outras, brancas. Naquela noite em que o vi jogar, das arquibancadas, ele fez o time para o qual torço, o Internacional, sofrer para vencer. Todas as jogadas do Estudiantes passavam pelos seus pés. E de suas passadas, todas as jogadas tinham sequência qualificada. O Internacional venceu a Copa Sul-Americana. E no Estádio Beira-Rio presenciei uma linda festa daquela torcida fanática que atravessou o Rio da Prata, chegou à Porto Alegre e apoiou seu time sem parar. Sem a vitória, veio a tristeza. O choro. Mas o orgulho estava em alta. Não houve sequer um registro de tumulto entre os torcedores. Ordeiramente, foram todos embora. Carregaram juntos a bandeira de seu time. E atravessaram o Rio da Prata de volta para casa. Em sua casa, voltaram a sonhar. E na impossibilidade de ver o meu time na Copa Libertadores da América do ano seguinte, naquela noite, diante de todos os acontecimentos, eu decidi: na próxima Copa Libertadores, torcerei pelo Estudiantes!
Não é de agora que o Estudiantes "belisca" uma conquista continental. Quem acompanha futebol, sabe. Desde o retorno de Verón ao time, anos atrás, muita coisa mudou. A liderança deste ídolo é algo fora do normal. Nas ruas, a torcida veste o 11 com orgulho. Jogadores de qualidade surgiram. Outros foram contratados. Mas maestro mesmo, só existe um nesta equipe. Confesso que fiquei dividido. Eu queria ver, como brasileiro, o título do Cruzeiro na Libertadores. Mas o Estudiantes era a equipe que eu tinha "fechado acordo de simpatizante" ao final do ano passado. Fiquei dividido. Desmoronei. Desmoronei tanto quanto a zaga celeste, no momento em que Verón atravessou uma bola do centro do campo para o lado direito de ataque. No cruzamento que veio, preciso, Fernandez empurrou a bola para a rede. Após o empate, o time seguiu mais vibrante do que nunca. O sonho era possível. E em uma cobrança precisa de escanteio do maestro da camisa 11, todos "Verón" o sonho mais perto ainda: cabeçada precisa de Boselli. Gol do Estudiantes. Virada. Estudiantes dois gols. Cruzeiro, apenas um. Em frente à televisão, imaginei La Plata. Percebi minha visão sendo tomada pelo vermelho e o branco. As cores tomaram conta das ruas. Das praças. La Plata sorria. Chorava. Imaginei o sonho daquela torcida sendo realizado. Uma "hinchada" que, praticamente, só ela acreditava no seu time. Assim como muitas vezes acontece. Muitos desconfiaram da capacidade da equipe. Até mesmo dentro da Argentina, muitos desconfiavam. Mas a força de quem acredita provou mais uma vez que supera qualquer dificuldade.
E veio a pressão do grande time do Cruzeiro. Jogadores como Kleber e Wagner são diferenciados. São excelentes peças do time celeste e, junto a seus companheiros, fizeram tudo o que era possível. Mas o Estudiantes fez mais. E veio a pressão de final de jogo. Voltei a imaginar as famílias torcendo, em La Plata, em frente à televisão. Colada à parede, a flâmula do tri-campeonato da Libertadores em 1970 está intacta, como um amuleto da sorte que resiste ao tempo. Resiste tanto quanto à tradição de uma equipe de fora do grande centro do futebol argentino e que não há palavras para explicar a sua força. Imagino aqueles senhores que viram o grande time dos anos 60 e 70, assistindo o jogo pelo televisor e se emocionando com o filho do grande craque de décadas passadas comandando sua equipe no rumo das vitórias para a nova geração. As lembranças são muitas. E ninguém queria acreditar que o sonho passaria diante dos olhos de todos como um pesadelo que se aproximava. E vieram instantes de tortura para o torcedor do time de La Plata. Foram momentos angustiantes.
Veio a pressão do Cruzeiro. Todos abandonaram qualquer tática, qualquer organização. Era só coração. Pulsante. De um lado, azul. De outro, vermelho. E o fabuloso goleiro Andújar rezava. De mãos com ele, parte do Mineirão que sacudia suas bandeiras vermelhas. E junto à eles toda a torcida da parte vermelha de La Plata. Milhares de apaixonados pelo Estudiantes podiam, aos poucos, sentir o grande momento chegar. Mas a pressão continuava. Sufoco. Bola na área. Bola na trave. O tempo estagnou. Os ponteiros do relógio travaram. São trinta e nove anos passando na mente de cada torcedor do time do Estudiantes como uma nave viajando pelo tempo em uma velocidade que só a história do futebol pode contar. Ouve-se um apito. Verón se ajoelha. O torcedor Verón está em campo neste momento. A braçadeira de comandante suada, a camisa 11 às costas e, agora, neste momento, a faixa no peito. O sonho. Verón, o maestro, junto aos seus guerreiros companheiros, fizeram história. Parte da imprensa brasileira ficou sem palavras. Mas eu amo futebol e acompanho sempre este esporte, tentando imaginar o que se passa dos dois lados da história. E essa foi mais uma grande decisão que vai ficar para a história. O Cruzeiro foi o grande vice-campeão do continente. Merece respeito e é uma equipe que brigará pelo título de campeão brasileiro. Já para o Estudiantes e toda sua fabulosa torcida, deixo meu respeito registrado e meus parabéns pelo título de Campeão da Copa Libertadores da América de 2009.
Recordei naquela noite de Mineirão lotado uma final de Libertadores ocorrida três anos atrás. O time do Inter do meu coração decidiu o título e sagrou-se campeão após uma jornada heróica e uma pressão generalizada do seu adversário. Assim ocorreu com o Estudiantes em sua conquista. Parece que voltei três anos na história. Este foi o sentimento e aqui o descrevo. Fica agora a minha torcida para que, em Abu Dhabi, o Estudiantes represente, não só a Argentina, mas a América do Sul, como ela merece. Eu não duvido de nada. E o adversário também é um velho conhecido de minha parte. Se Barcelona e Estudiantes chegarem à decisão da Copa do Mundo de Clubes - e ambos tem todas as condições para isso - será outro daqueles jogos para a história. E no momento em que isso ocorrer, tudo será possível. E para o Estudiantes, será um capítulo a mais de glória na sua existência. Não será uma novidade. Se não acredito? Acredito.
Sobre Verón: é um dos maiores jogadores que já vi jogar! Quem aprecia futebol de qualidade, deve ter opinião parecida. E para completar, na decisão da Copa Libertadores, Verón não só ajudou a marcação do meio-campo, anulando as presenças qualificadas de Ramires e de Wagner, como comandou o time à vitória, com passes qualificados, desarmes, posicionamento certo e assistência para o gol do título, sendo que iniciou ainda a jogada do gol de empate. E para finalizar, ergueu a Copa Libertadores em direção ao céu!
A história mostra que é tudo é possível quando defrontam-se duas grandes equipes. Ainda mais se tratando de Estudiantes e dessa escola disciplinada de futebol que a equipe de La Plata representa. Em se falando de mundial interclubes, é lógico que para Estudiantes e Barcelona chegarem até a final, terão que derrotar seus adversários. Mas desde já, fica registrada minha torcida para o time do país vizinho. Nada é impossível. O Barcelona de Ronaldinho Gaúcho que o diga, anos atrás. E por falar nisso, Old Traford e o lendário esquadrão do Manchester United de 1968 também sofreram nas mãos de um time disciplinado taticamente e que tinha o título como um objetivo maior do que a própria vida! Assim como o Estudiantes de 2009!
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Um comentário:
Foi uma bela demonstração de comprometimento ao melhor estilo pampeano. E se me definirem como bairrista,deixarei uma questão p/ reflexâo: Como classificar uma rede (Globo) que na noite da final da maior competição sul americana,transmitiu p/ S.Paulo outro jogo do Corinthians??
Larguei...
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